Em dezembro de 2003, a senadora Ideli Salvatti, do PT-SC, apresentou projeto de lei, com bem fundamentada justificação, da qual reproduzimos alguns parágrafos, bastante interessantes:
“A proposta ora apresentada visa implementar uma nova política para o setor de exploração de loterias no Brasil.
Além de trazer uma transparência e controle social que a atividade precisa, trará uma efetiva arrecadação de recursos financeiros, para contribuir significativamente com a implementação das políticas sociais do Governo na área da inclusão social, através do desporto e da área cultural.
Não podemos ignorar que a atividade de jogos, como bingo e vídeo bingo, está espalhada pelo País sem o necessário amparo legal em alguns Estados da Federação; porém movimenta grandes quantias de dinheiro e gera milhares de empregos diretos e indiretos.
A atividade de bingo, por exemplo, movimenta centenas de milhões por ano, além de empregar cerca de 120 mil pessoas, segundo a revista ‘Isto É’, de 3 de dezembro de 2003.
No entanto, sem regulamentação específica, esta atividade tem funcionado sem o controle da Receita Federal, do Conselho de Controle de Atividade Financeira (COAF) e de outros órgãos que, em tese, deveriam fiscalizar o setor, acusado de ser propício à lavagem de dinheiro e à sonegação fiscal.
Segundo a Associação Brasileira de Bingos (Abrabin), a atividade poderia repassar cerca de R$ 250 milhões por ano aos cofres públicos, além dos impostos.
Segundo o Ministério Público Federal, em notícias veiculadas na mídia, há indícios de que esta atividade estaria sendo controlada por organizações criminosas no Brasil.
Isto reforça a necessidade urgente do Estado brasileiro tomar medidas para um controle efetivo, utilizando-se dos recursos tecnológicos já disponíveis para estes fins.
Hoje, no País, os bingos e outros tipos de jogos funcionam uns por liminares judiciais, outros por convivência imoral das autoridades que deveriam combater este tipo de atividade, ora ilícita.
Ressalte-se que aqueles que funcionam com liminares concedidas pelo Poder Judiciário nada recolhem para os cofres públicos.
Importa salientar que alguns Estados, como Rio de Janeiro, Santa Catarina, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Rondônia, Rio Grande do Sul, Alagoas e outros que já regularizaram a atividade através de leis estaduais, estão baseados no princípio constitucional de que as loterias não estão relacionadas entre os serviços públicos de monopólio da União, e pela premissa estabelecida no Art. 25, §1º, da Constituição Federal (competência remanescente).
Porém, todos a seu modo, sem uma diretriz nacional. Por isto, há a necessidade de uma regra geral e uma reformulação de todo o sistema lotérico brasileiro.
A legislação que rege esta matéria é muito arcaica e confusa, ensejando vários entendimentos. Fato este constatado nas liminares judiciais concedidas”.
Estranhamente, o mesmo governo que mostrava tanto empenho na regulamentação dos bingos, decorridos apenas 2 meses, mudou de direção e através da MP 168/04 proibiu aquela modalidade de jogo.
A mesma senadora, cuja justificação está acima reproduzida, tomou obstinada posição contra os seus próprios argumentos expostos, repita-se, 2 meses antes. Uma contradição inexplicável que desafia todos os conceitos da lógica e da razão.
Raymundo Nonato, um dirigente que marcou a história do nosso Sindicato, privou da amizade de Getúlio Vargas apoiando as medidas presidenciais em prol dos direitos trabalhistas, do desenvolvimento social e da independência econômica do Brasil.
No livro “Torcedores de Ontem de de Hoje”, de João Antero de Carvalho (1ª edição de 1968, prefaciada pelo escritor e jornalista Nelson Rodrigues, e 2ª edição, de 2005, prefaciada por outro célebre tricolor, Francisco Horta) está o capítulo Raymundo Nonato: um flamenguista pugnaz, com o perfil do notável sindicalista:
Já aos 15 anos secretariava Raymundo Nonato da Costa Rocha a Federação dos Trabalhadores no Pará, entidade que agrupava todas as categorias profissionais do Estado.
Pleiteava-se, então, para os padeiros uma folga aos domingos à tarde, porquanto trabalhavam onze horas por dia, inclusive nos feriados. Queria ele uma folgazinha para prestar assistência à família.
E os próprios padeiros, que não eram de ferro, precisavam espairecer para que o cansaço não desse em fabrico de pão ázimo.
Nonato entrou na luta de peito aberto; tomou posição e passou a agir com desassombro. Estávamos nos idos de 1918, quando as reivindicações eram impedidas a patas de cavalos.
Ele, porém, que já levara uns bons pares de coices, perdera o medo e passou para o escalão dos “perigosos” ou dos “anarquistas”, assim chamados os líderes trabalhistas daquele tempo.
Durante uma manifestação, a polícia logo apareceu. Nonato foi detido com os companheiros de diretoria e mais alguns associados da federação.
No dia seguinte, os jornais apresentavam pomposa manchete: “Preso um anarquista mirim!”. Seguiam-se os comentários à sua destemida atuação, que lhe custou, pelo menos, ameaça de surra por parte do pai, que o foi buscar na delegacia.
Aí está o início do capítulo que retrata os duros tempos nos quais a luta pela justiça social era encarada como uma questão de polícia e os movimentos operários sofriam violenta repressão.
Na foto, Vargas e Nonato, em 1950, no “Retiro do Itu”, São Borja, RS.